Há alguns anos, fui numa massagista chinesa aqui em Porto Alegre. Da China mesmo. Passava alguns meses do ano no sul do Brasil, tinha uma técnica incrível. Resolvi conhecer.
Falava pouquíssimo português, o suficiente para eu entender, além dos pequenos olhos asiáticos arregalados, que ficara surpresa ao me ver, sem uma mão, chegando em sua sala alugada.
“Na China não tem, né. Tiram bebê quando vem assim”. Completou com um gesto de corte feito com a mão no ar.
Quase me desculpando, disse que no Brasil, veja só, nascemos. Com ou sem mão.
Ela riu, riso chinês, doce e silencioso, e eu já não sabia se seria uma boa ideia ser tocado por uma mulher que, até o momento, só conhecia dores musculares de anatomias impecavelmente perfeitas.
Para quebrar o gelo, porque na minha cabeça ainda restava uma possibilidade, perguntei se tirava apenas a camiseta. “Sim, sim”, disse ela, e completou: “na China não…” Ainda estava digerindo a novidade, nossa chinesa desavisada.
Guardei dessa experiência o sorriso doce, a força descomunal daquela mulher na minha coluna e sua surpresa ao perceber que não me mataram antes de eu nascer.
Lembrei dessa história ontem, justamente enquanto participava de um encontro com pais que dedicam suas existências para manter a vida de seus filhos que, ao contrário do que me contou a chinesa massagista, insistiram em nascer. Vidas frágeis, infinitamente mais delicadas do que gostaríamos, mas persistentes. E necessárias!
Pais que em nenhum momento pensaram em voltar atrás ou fazer diferente na próxima. Pais que entenderam sua missão de vida, aliás, que entenderam o potencial da VIDA após gerarem filhos com alguma deficiência.
Não tenho mais meus pais para perguntar sobre seus medos e preocupações ao terem um filho sem uma mão.
Mas ontem, Jader, Cristiano, Henri, Jorge, Andreia, Rafaela, Tito e Vitão me mostraram que, passado o susto inicial, não há medo, não há recuo. Há força e união. Rede de apoio, informação e afeto.
E como se abraçam. Sem receio da intimidade porque algo muito maior os une: a crença de que apenas na diferença se vive uma vida plena.
Nossa deficiência não é contagiosa. Aproxime-se. Faça um mundo melhor!