Ora bolas, a gente se entrega à vida como devoto em procissão, como craque em dia de decisão. E mesmo assim, faz parte do jogo, a gente se distrai.
Minha terapeuta chama de “vício psicológico”. Ao menos foi o que entendi. Trata-se daquele hábito de distrair a mente com algo que nos prende a uma situação que sequer bem nos faz. E a repetir em um looping cruel.
É como despertar e pensar diariamente nas contas a pagar. Mesmo quando já estão pagas e tem grana sobrando para as próximas. Ok, parece mais um sonho, talvez a pessoa ainda esteja dormindo, mas você entendeu.
Ou como se pensássemos a cada segundo na ex com a mesma força com que queremos esquecê-la. Vício. Já nos acostumamos com a presença desconfortável do pensamento.
Todos podemos ser viciados. Presos em tentar controlar o incontornável.
Às vezes dói mais. Noutras, nem. Mas o sofrimento verdadeiro, aquele que nos corrói, é a tonelada de energia roubada. Como em qualquer vício, rouba-se vida do vivente. De dentro para fora, o pior dos crimes.
E nos distrai dos nossos papéis fundamentais. Crime qualificado. Culposo. Doloso. Enfim, os doutores que o definam. O que sei é que se nos rouba de nós mesmos, não podemos deixar passar.
Nos sentimos como se o GPS tivesse congelado num trecho da rota e não conseguíssemos mais pensar com a própria cabeça ao seguir o percurso que fizemos sem ajuda a vida inteira.
Um hábito pressupõe uma recompensa. Mas estes só entregam desfoque. A ideia aqui é achar um novo hábito e uma recompensa que brilhe mais do que a anterior. E, assim, acabar com essa loucura de nos distrairmos do real.
Já foi dito à exaustão: viva o tempo presente. Hoje. É o que temos. Que seja este o nosso novo vício. Viver o tempo presente. E que a recompensa seja, ora bolas, a vida mesmo.