Sempre tive um medo paralisante de que o Gianluca, meu primeiro bebê, passasse a ter vergonha de mim quando reparasse que eu não tinha uma mão. Fantasiava que o coração dele ia se esvaziar do amor que tinha por um pai perfeito que, ora bolas, de perfeito não tinha nada.
Por muito tempo sofri com a expectativa da chegada desse dia. Do momento do abandono. Do segundo em que eu começaria a murchar por falta desse amor.
Eis que, como eu previ, esse dia chegou para me rasgar. Segundos de aflição, coração acelerado, manada de elefantes no meu peito. Quero a tua reação, meu filho. Mas devagar. Sei que vou sofrer. Não me machuca. Por favor.
Era uma tarde de sábado, os dois sentados no chão. Brincávamos de carrinho e caminhão de madeira colorida.
Olhou fixamente para o que não enxergava. Depois, me fitou nos olhos, com sua dúvida de um azul profundo, como quem pergunta: ‘onde deixou essa parte de você?’.
Foram 30 anos me preparando para decepcionar a pessoa que eu mais amava. Contei a verdade.
Sorriu. Voltou para o caminhão de madeira colorida.
Como pulmão que volta de um afogamento, num sopro longo e sonoro de encher o peito, foi assim quando chegou minha sobrevida.
Tudo para o qual eu me preparei e parecia inevitável não aconteceu. Sigo sendo amado e admirado, tipo super-herói, 12 anos depois daquela tarde ensolarada de sábado.
Provavelmente me deram coração a mais para compensar a mão de menos.
Muito possível que isso não seja mesmo um texto. Acredito que te entreguei um pedaço da minha história. Cuida como se fosse tua.