Foto: blog_pai_mala

Pai ninja

Às vezes tenho a certeza de que me tornei pai só para brincar de carrinho de novo.

Incrível como me perco por horas fazendo corridas, dirigindo por ruas imaginárias, abastecendo os carros de gasolina de mentirinha, fazendo pffffffff com a boca para imitar o som da bomba de combustível. E mais incrível ainda como me acho nesses momentos de entrega absoluta aos meus filhotes.

Não basta sentar no banquinho para brincar, “não, papai, senta no chão que nem eu”. Claro, aqui estou. O problema é me tirar da brincadeira.

Depois dos carrinhos e nossas pistas de hot wheels, minha preferência é pela massinha de modelar. Santo cristo, quem dedica anos de terapia para resolver seus conflitos e traumas nunca brincou com uma simples massinha de modelar. Rivotril para quê? Play Doh na veia e me tranquilizo para todo o sempre. Às vezes dá briga porque essa cor é dele e não minha, mas na maior parte do tempo, nos entendemos.

Brincar com os filhos tem outro lado sensacional: qualquer bola disforme de massinha que você fizer para seu filho de 3 anos, faz de você um “ninja”, segundo depoimento do Stefano. Fiz uma cobrinha e cortei em pedaços, “uauuu papai me ensina”?

E as bolhinhas de sabão? São um capítulo à parte. Não gaste mil reais numa caixa de Lego. Invista R$2,50 num tubo de água com detergente e faça bolhas de sabão. E role de tanto rir. E estoure todas elas e se emocione com o olhar estasiado do seu filho caçula acompanhando cada uma delas. E faça uma bolha gigante e vire “ninja” de novo! E brinque de bolhinhas de sabão com seu filho de 10 anos também e divirta-se tanto ou mais. Bolhinha de sabão, que invenção. Talvez nosso coração seja feito de bolhas de sabão. Ao menos aqui em casa, acredito que sim.

E aqui vamos fazer uma combinação: nada de falar em andar de bicicleta e no apoio que você dará a seu filho no dia em que ele se sentir pronto para tirar as rodinhas, e você derramar muitas lágrimas com a conquista dele, peito estufado de orgulho.

Mas brincar também tem seus anti-heróis.

Dê um tablet para essa criança e a massinha resseca, a bolha de sabão não flutua, o carrinho atola.

Ok, existem aplicativos educativos, dá pra ler livrinho por lá também, mas as crianças dão uma murchada, isso é bem verdade.

Dá pra ver filmes neles e ainda rolam grandes risadas, mas nada se compara a uma criança de 40 anos rolando no chão com outra de 3 em busca de bolhas de sabão embaixo da mesa.

O tablet é individual, artificial. A massinha e os carrinhos nos enriquecem. A cada “buuuuum” das batidas dos carrinhos, nosso vínculo aumenta. A cada Minion que fazemos de massinha, nossa confiança mútua se reforça. A cada bolha que estoura no meu nariz, nossa cumplicidade se fortalece. A cada novo aplicativo baixado, a briga por desligar o tablet na hora do almoço começa.

Não, claro que não sou um “pai mala” tão “mala” assim. Adoro uma tecnologia, curto demais a Apple e todos seus “i” alguma coisa, mas esses caras geniais criam facilidades, modismos, e eu estou falando de amor, de gente se tocando, de frustração pelo carrinho quebrado, de massinha caindo no chão e grudando no tapete e da mãe xingando, dessas coisas da vida real que a gente só encontra quando se olha, se toca e se percebe.

Eu to falando em ser pai. E pra isso, vocês sabem, não inventaram aplicativo algum.

Para isso virei pai: para sentir coisas que não se sente de outra forma. Para reforçar o amor com massinha, bolhas e carrinhos.

Cada família tem as suas brincadeiras, formas únicas de se chegar ao coração do outro. As nossas são essas. O importante é acharmos esses caminhos. Ainda mais em tempos confusos como os atuais, em que sufoca essa falta de perspectiva, e cujos nervos a flor da pele podem alterar nossa percepção.

O simples nos conecta, a bolha é leve e seu sabão limpa nossa alma.

Agora, larga esse smartphone e te atira no chão, rola até doer as costas e mostra que baita pai-ninja você é.

 

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