Mais que perfeito

Faço um exercício de vez em quando: relembro a família que éramos lá atrás. Penso nas formas com que vivia minha paternidade, as amizades, o amor. Me proponho a avaliar o quanto mudei e o quanto a vida me obrigou a mudar. Nem tudo é escolha. Às vezes mudamos “na marra” mesmo porque a vida nem sempre vem em ondas, tem vezes que ela te derruba com a determinação de um tsunami. E aí, das duas, uma.

Gosto desse voltar no tempo, e uso ele para valorizar o tanto que já passou por mim e, principalmente, o que escolhi para ficar aqui dentro, guardadinho e protegido.

Não é um olhar nostálgico, mesmo que dê saudades de algumas coisas. É uma lente que me permite entender para onde estou indo. Como pai e como homem.

Há quem diga que repetir o passado é um erro. Geralmente é. Por isso não perco ele de vista. Mas ele sabe ser sacana, afinal nos conhece como a palma da mão e usa todos os gatilhos que capturam para tentar nos fazer ficar por lá, curtindo histórias passadas.

Não caíamos nessa. Olhemos para trás agarrados no presente e mirando o futuro.

O passado não se transforma mais, o presente pouco existe e o futuro, menos ainda. Então, aqui é onde quero, finalmente, chegar: o segredo da vida, desconfio, esteja em saber dosar o quanto dedicamos a cada um destes tempos. Se vamos nos perder no passado, nos dedicar ao futuro ou amar no presente. Ou vice e versa.

Sempre fui fascinado por um termo, mais do que gramática, para mim, um poema: “pretérito mais que perfeito”. Mal estudamos ele na escola porque um nome com tanta potência, aos 12 anos, não diz muito.

Por isso é bom o tempo passar. A idade permite que inventemos outro tempo verbal: o “presente mais que perfeito”, aquele momento do abraço apertado em quem se ama para nos preencher mutuamente. O segundo exato, mais que perfeito, em que o olhar do teu filho acalma tua respiração. O cheiro de café passado por ou para quem a gente ama, enche os pulmões de carinho e a cafeína do amor faz o coração pulsar.

Mais que perfeito pode ser pretérito, presente ou futuro. Basta saber deixar, guardar ou levar. Na caixinha certa dos afetos necessários. Na ordem certa das nossas paixões mais caras.

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